Acabo de ler um livro de Tony Parsons. Mais uma vez uma confirmação daquilo que penso, palavras claras e simples que nos mostram que já somos o que queremos ser. Aqui vão algumas passagens de livro.
A iluminação está absolutamente mais além do meu esforço por mudar a maneira em que vivo, ou até de mudar a vida em absoluto. Tem a ver com uma mudança total na compreensão de “quem” é quem vive. Pois eu já sou isso que procuro.
As doutrinas, os processos e as vias progressivas que buscam a iluminação, só exacerbam o problema de aqueles a quem se dirigem, reforçando a ideia de que o si mesmo pode encontrar algo que supõe que perdeu.
A vida não é um trabalho. Não há absolutamente nada para alcançar excepto a compreensão de que não há absolutamente nada para alcançar.
Aqueles que fazem proclamações de iluminação ou que adoptam certas aparências (…) necessitam, muitas vezes, adoptar o papel de “mestres espirituais” ou de “mestres iluminados” e atraem inevitavelmente aqueles que necessitam ser estudantes ou discípulos. Aqueles que compreenderam e abraçaram plenamente a iluminação não têm absolutamente nada para vender. Quando compartem a sua compreensão, não necessitam embelezar-se a si mesmos ou o que compartem. Tampouco têm algum interesse em ser mães, pais ou mestres.
A vida é o seu próprio propósito e não necessita uma razão de ser. Essa é a sua beleza.
A presença é totalmente sem esforço e está mais perto de mim que o respirar. A presença só pode ser admitida e reconhecida. Nós somos a única fonte da nossa própria criação.
Talvez seja o meu medo o que engendra a minha crença num começo e num final. É o medo de perder-me a mim mesmo o que pode perpetuar e alimentar o meu impulso a sobreviver e a continuar, e o que mais anseio e temo é a ausência de mim mesmo.
Só posso sentir culpa se julgo quem sou desde uma disposição de sistemas de crença que me ensinaram ou que construí por mim mesmo.
Cada situação é completa. Cada momento é a sua própria recompensa. Está aqui e depois vai-se. Não há nenhuma dívida vindoura para pagar.
Todos os conceitos de bem e mal, de pecado original, de karma ou de dívida de qualquer tipo são os produtos de uma mente não despertada que está fechada no tempo e na manutenção e reforço de um sentido de pai, mãe e mim mesmo.
A maneira na qual me relaciono com os outros é um reflexo muito poderoso da relação mais fundamental de todas, e essa é a relação comigo mesmo. Há tantas variantes como pessoas. Mas os modelos são só uma confirmação das minhas necessidades e crenças particulares, e reflectem isso que todavia não redescobri.
Nada, absolutamente nada, necessita ser agregado nem tirado. Nada é mais válido ou sagrado que nada. Não se necessita cumprir nenhuma condição. Não há nenhum ponto de referência. Tudo é justo e como deve ser, justamente agora. Não há ninguém que necessite a liberação. Nem sequer tenho que esperar que descenda a graça, pois eu já sou, você já é, ele já é a graça permanente.
Somos infelizes porque não aceitamos que estamos divididos em dois para ser um novamente. É um jogo que a consciência está a jogar, e às vezes não parece muito divertido. A separação é a experiência que a consciência elege ter, com toda a sua diversidade; e o jogo é dançar dentro e fora da separação e da unidade.
Se a sua crença é que as suas acções boas ou más terão um efeito, então assim será enquanto você acredite. A experiência alimenta a crença e a crença alimenta a experiência.
Esteja aberto à ideia de viver o resto da sua vida no caos; abandone-se a não ter que saber nada mais. Relaxe e deixe que tudo aconteça, porque de todos modos acontecerá.
Aprofunde-se na sua consciência e siga perguntando “quem” é que quer meditar. Quem é que possui o tráfico mental ou os bloqueios emocionais? De onde vêm? De onde vem qualquer pensamento ou emoção?
O problema com a terapia é que pressupõe que há um problema.
Uma vez que acontece o despertar, já não há, simples e absolutamente, nada que um necessite possuir, é o fim de toda a necessidade. Já não há nenhuma necessidade ou desejo de ajudar ninguém. Todas as coisas e todos são luz, a expressão infinita, justamente como são. Estou procurando dizer-lhe que você não necessita ajuda. Justamente como você é, é como necessita ser.
Nós estamos fechados na crença de que as nossas vidas têm algum tipo de propósito que temos que cumprir. Continuamos a esforçar-nos para dar cumprimento às ideias que temos sobre o que necessitamos fazer, ou sobre algum lugar que necessitamos chegar com o fim de ser dignos da iluminação. Claro, nunca o logramos, porque estamos tratando de satisfazer alguma ideia que é só imaginária. Toda esta actividade reforça a sensação de esforço individual, e assim continua o jogo. Qualquer indicação de que esta actividade não tem nenhum sentido é uma ameaça para a mente.
O infinito está em repouso, e então o infinito joga. Parte desse jogo, que você mesmo originou, é ter a experiência de sentir-se separado e depois voltar a casa. O infinito goza da experiência da limitação, com a possibilidade da liberação.
Hitler, como todos os demais, representou a personagem que a consciência elegeu, e a morte é simplesmente um retorno à fonte de onde apareceu a personagem.
A vida é o único gurú. Tudo o que lhe aconteceu até agora é o seu ensinamento e é absolutamente apropriado para o seu despertar. (Se tem que buscar) Eu diria que busque um mestre que não lhe dê nada, nenhuma esperança, nenhum método, nenhuma oferta pessoal que lhe leve ali, porque, obviamente, não há nenhum lugar onde ir.
A iluminação é a nossa maneira de ser natural e ordinária.
“Não há outra felicidade neste mundo
Senão o estar livre do pensamento
De que eu sou diferente de Ti.
Que outra felicidade existe?
Como sucede, pois, que este devoto teu
Ainda caminhe pela via errónea?”
Śiva-Stotra-Avalī (4.17) de Utpaladeva
“Tudo é o Absoluto (Brahman, Śiva…) e Ele somente. Não há outro. Eu sou Isto. Em verdade, eu sou Isto. Sou Isto somente. Sou Isto somente. Sou somente o eterno Absoluto.
Sou somente o Absoluto, não o mundano (samsārin). Sou o Absoluto somente. Não tenho mente Sou somente o Absoluto. Não tenho sabedoria (buddhi). Sou o Absoluto somente, e não os sentidos.
Sou o Absoluto somente. Não sou o corpo. Sou o Absoluto somente, e não o “pasto das vacas” [i.e., o campo da existência cósmica]. Sou o Absoluto somente. Não sou a psique (jíva). Sou o absoluto somente e não a existência diferenciada.
Sou o Absoluto somente. Não sou inconsciente. Sou o Absoluto. Não conheço a morte. Sou o Absoluto somente, e não a força vital (prāna). Sou o Absoluto somente, mais excelso que o excelso.
Tudo é o Absoluto e Ele somente. O tríplice mundo é pura Consciência, o puro Absoluto. Não há nada senão a beatitude, suprema beatitude (parama-ānanda).”
Passagens do Tejo-Bindu-Upaniśad
É importante referir que sendo o Absoluto somos tudo, inclusive o prāna, a mente, o corpo, a psique, etc. O que aqui se refere, tal como noutros textos, é para não nos identificarmos com o particular que apenas é uma parte do todo.
“Sou semelhante ao louco inútil que ordenha uma vaca sem leite numa sala escura!
Como sou louco!
É vão
Poema de Appar onde se define como um louco que não consegue perceber a constante proximidade de Śiva.
Textos retirados do livro "A Tradição do Yoga" de Georg Feuerstein
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A SABEDORIA DA LOUCURA E OS ADEPTOS LOUCOS
Trechos escolhidos e extraídos do livro “A Tradição do Yoga” de Georg Feuerstein
“No Tibete existe uma tradição que leva o nome de “louca sabedoria”, ou “sabedoria da loucura”. O fenómeno designado por essa expressão se faz presente em todas as grandes religiões do mundo, embora quase nunca seja reconhecido como expressão válida da vida espiritual pela ortodoxia religiosa ou pelo sistema secular. A sabedoria da loucura é um modo singular de ensinar que se vale de meios aparentemente irreligiosos ou anti-espirituais para despertar a personalidade egóica convencional do sono espiritual em que vive mergulhada.
Os meios não-convencionais empregados pelos adeptos que optam por esse jeito arriscado de pregar parecem loucos ou insanos aos olhos das pessoas comuns, que quase nunca enxergam o que está além das aparências. Os métodos da sabedoria da loucura são feitos para chocar, mas sua intenção é sempre benigna: demonstrar ao mundano comum (samsārin) a “loucura” da sua existência vil, a qual, do ponto de vista da iluminação, é uma existência que se funda numa tremenda ilusão. Essa ilusão é o arraigadíssimo pressuposto de que o indivíduo é uma entidade egóica limitada pela pele que recobre o corpo humano, e não a Ipseidade Absoluta do ātman ou natureza buddhica. (…)
O santo louco faz parte das religiões como o buddhismo, cristianismo, judaísmo, islamismo e outras. Um exemplo de adepto louco foi São Simao, um louco de Cristo do século VI. “Certa vez ele encontrou um cachorro morto num monte de esterco. Amarrou a corda que lhe servia de cinto à perna do cachorro e arrastou o cadáver atrás de si por toda a cidade. As pessoas ficaram escandalizadas e não perceberam que o cachorro morto arrastado pelo monge doido era um símbolo do excesso de bagagem que elas mesmo levavam consigo – o ego, a mente convencional, destituída de amor e sabedoria. (…)
(…) Com sua conduta selvagem e excêntrica, os adeptos loucos estão sempre pondo em cheque as limitações que os indivíduos não-iluminados (eu diria aqueles que assim se consideram) têm como certas, e desse modo fazem-nos defrontar com a realidade nua existencial: a de que a vida é louca e imprevisível, excepto pelo facto inelutável de que o período que passamos mergulhados no caos da manifestação é sempre muito breve. (…)
(…) Ao contrário da sabedoria convencional, que tem o objectivo de criar uma ordem ou harmonia superior, a sabedoria da loucura tem sobretudo a função de dilacerar o entusiasmo modelador da humanidade, a aspiração humana à criação de uma ordem, de uma estrutura, de um sentido. (…)
(…) É preciso distinguir cuidadosamente a “naturalidade” do adepto enlouquecido da mera impulsividade da criança e da instabilidade emocional do adulto; do mesmo modo, é preciso distingui-la daquela espécie de espontaneidade erudita que é o objectivo de várias terapias humanistas. A espontaneidade iluminada (sahaja) é muito mais do que uma intensificação da consciência ou uma integração do corpo e da mente enquadrada num contexto de psico-higiene. O adepto realizado não é apenas um ego especialmente bem sucedido. A espontaneidade dele é absolutamente pura e coincide com o próprio processo da manifestação universal. Ele é o Todo, e todas as acções dele nascem desse Todo.”